A desnutrição observada em pacientes em estado crítico resulta em alterações metabólicas importantes que requerem atenção do médico-veterinário; veja detalhes

A desnutrição pode ser caracterizada como uma síndrome clínica em consequência de um balanço energético e/ou proteico negativo, capaz de promover diversas alterações fisiológicas na tentativa de adaptar o organismo à escassez de nutrientes. Embora sua classificação ainda não seja ainda bem estabelecida na medicina veterinária, em seres humanos é classificada quanto sua clínica, evolução ou intensidade:

  • Clínica: calórica, proteica, mista
  • Evolutiva: aguda, crônica
  • Intensidade: leve, moderada, severa

Sua etiologia também pode ser classificada em:

  • Primária: dieta deficiente ou aumento das necessidades;
  • Secundária: presença de doença concomitante (neoplasias, diabetes, distúrbios gastrointestinais, doença renal crônica, trauma, hipermetabolismo, etc).

Manifestações clínicas da desnutrição calórico-proteica em animais

As características observadas ao exame clínico incluem:

  • Perda de peso e baixo Escore de Condição Corporal (ECC)
  • Baixo Escore de Massa Muscular (EMM)
  • Pele seca com descamação
  • Pelo opaco e quebradiço
  • Edema em extremidades
  • Hepatomegalia
  • Desidratação
  • Anorexia ou hiporexia
  • Apatia

Fisiopatologia

Em animais enfermos, a resposta inflamatória provoca alterações metabólicas que geram um estado de catabolismo proteico por meio da secreção aumentada de glucagon, catecolaminas, cortisol, hormônio do crescimento e citocinas, que antagonizam os efeitos da insulina e induzem hiperglicemia e degradação de proteína tecidual para fornecer substrato para a gliconeogênese.

Esse mecanismo perpetua a perda de massa corporal magra. Devido à ausência de ingestão alimentar, a principal fonte de energia resulta de uma proteólise acelerada. Assim sendo, caso não seja instituída uma terapia nutricional adequada, estes animais muitas vezes terão prognóstico pouco favorável.

Além disso, em situações graves de sepse, isquemia, traumas ou agravamento de doenças crônicas, ocorre um incremento drástico na produção de radicais livres de oxigênio podendo resultar em situações de estresse oxidativo, que inclui ativação de células fagocíticas do sistema imune, produção de óxido nítrico pelo endotélio vascular, liberação de íons de ferro, cobre e metaloproteínas.

A desnutrição pode ser considerada como um fator determinante desta condição, sendo conhecido que as deficiências nutricionais de alguns micronutrientes relacionados com o sistema de defesa antioxidante, como o magnésio, selênio, zinco, cobre, vitaminas A, C, E, e o excesso de outros como o ferro, encontram-se relacionados com as alterações metabólicas ligadas a um aumento na produção de radicais livres associada ao maior dano oxidativo.

Consequências da desnutrição calórico-proteica

Os efeitos da má-nutrição calórico-protéica tendem a ser específicos para cada tecido e podem se tornar generalizados quanto maior for a demora em sua correção. Longos períodos de privação alimentar culminam em grande mobilização de aminoácidos, na produção de proteínas de fase aguda e de energia (gliconeogênese), agravando ainda mais o estado de desnutrição.

Pacientes em escore de condição corporal pobre, com perda das reservas nutricionais orgânicas, demonstraram maior mortalidade do que aqueles em condição nutricional ideal ou mesmo em sobrepeso e, por este motivo, a desnutrição é um dos maiores fatores contribuintes para falência múltipla dos órgãos.

Sabe-se que o intestino contém 60-70% de todo o tecido linfóide do organismo, e suas funções de barreira possuem mecanismos complexos. A ingestão de alimentos ou sua administração por via enteral estimula a secreção de IgA pelas glândulas salivares e trato biliar, que se aderem às bactérias na luz intestinal, prevenindo dessa forma o ataque bacteriano as células epiteliais intestinais e posterior inflamação local.

Suporte nutricional

Pacientes críticos estão mais susceptíveis a déficits de nutrientes, pois a condição hipermetabólica induz a um aumento das necessidades, que muitas vezes não são supridas com o uso de dietas de manutenção. O hipermetabolismo é sustentado primariamente por oxidação de gordura e catabolismo proteico. Assim, proteínas e gorduras são importantes fontes de energia para pacientes críticos, e um protocolo nutricional adequado deve ser instituído nestes animais.

Estudos que avaliaram os benefícios do suporte nutricional no paciente crítico concluíram que:

  • Animais que receberam adequado suporte nutricional durante a hospitalização apresentaram maior taxa de alta quando comparado aos que não o receberam;
  • A quantidade de energia metabolizável administrada ao animal mostrou-se diretamente relacionada com sua alta e tempo de internação: quanto maior a quantidade de calorias administradas, maior a taxa de alta e maior o tempo de hospitalização, favorecendo o curso de terapias mais prolongadas;
  • A condição corporal do animal demonstrou associação com as taxas de alta e óbito: animais sem reservas corporais, em estado de magreza ou caquexia, apresentaram maior taxa de óbito.

Por outro lado, alguns pontos necessitam de atenção do médico-veterinário para se evitar falhas no manejo nutricional, como:

  • Difusão da responsabilidade no cuidado do paciente;
  • Uso prolongado de soluções intravenosas salinas e glicosadas;
  • Falha em quantificar a ingestão de alimento pelo paciente;
  • Jejum em função de testes diagnósticos;
  • Não reconhecimento das necessidades nutricionais aumentadas devido à injúria ou doença;
  • Não proporcionar suporte nutricional após cirurgia;
  • Não reconhecer o papel da nutrição na prevenção e recuperação de infecções;
  • Ausência de comunicação e interação entre clínicos e nutricionistas.

Referências bibliográficas

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Fonte: Portal Vet Royal Canin